sábado, 20 de março de 2010

Emília, quem sabe nem todas as leis peguem?

IZETI FRAGATA TORRALVO
Coordenadora de Português do Colégio Bandeirantes

Passo por situações semelhantes às que você relata, pois a reforma ortográfica dispensou, em diversos aspectos, a lógica ou ao menos o bom senso. Não há explicações plausíveis a oferecer aos nossos alunos. Imagino o embaraço de estrangeiros que, por algum motivo queiram estudar Português! Não há lemes seguros que orientem a pronúncia, será necessário decorar, decorar, decorar e ter memória privilegiada, você tem toda razão.

No entanto, talvez nem todos os decretos autoritários determinados pela Reforma Ortográfica prevaleçam; quem sabe gramáticos, filólogos e linguistas possam revogar alguns desses disparates. Essa minha esperança se deve em parte por saber que escritores, como José Saramago, não cederam integralmente às novas leis ortográficas. Assim, em seu último livro - A viagem do elefante – ainda que estejam banidos os tremas, os acentos agudos nos ditongos abertos éu, éi e ói, presentes em palavras paroxítonas e vários acentos diferenciais, permanecem solidamente grafadas as consoantes mudas que, de acordo com o artigo “Das sequências consonânticas”, deveriam ser suprimidas. Não se perdeu, desse modo, o prazer de se penetrar na sonoridade das palavras de Saramago que nos fazem ouvir o sotaque lusitano. Essa possibilidade não diz respeito somente ao encanto de se deixar embalar pela melodia da Língua Portuguesa de além-mar, mas de se preservarem as nuances do discurso original do escritor, completamente compreendido por quem aprendeu Português aqui, em Angola ou Macau. Ao menos isso ainda não nos roubaram e podemos prolongar a agradável sensação provocada pela sonoridade do registro, por exemplo, de: “Uma rainha a chorar é um espectáculo”.

Quem sabe, como tantos decretos brasileiros, algumas leis da nova ortografia não “peguem”?

http://bit.ly/1Q1Nvs

Postado por: Suely

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